sábado, 7 de abril de 2012

100 ANOS DA TRAGÉDIA DO RMS TITANIC

Desde os primeiros instantes do dia até o início da noite de 15 de abril de 1912, diversos informes contraditórios davam conta de que o Titanic ainda navegava por meios próprios e que nenhuma vida havia sido perdida. Tal expectativa foi arrasada com a mensagem enviada pelo Olimpic no início da noite: “O Carpathia chegou à posição do Titanic ao raiar do dia. Só encontrou botes e destroços. O Titanic desapareceu por volta da 2h20 a 41.16N e 50.14O. Todos os seus botes foram recuperados. Cerca de 675 (na verdade 711)pessoas salvas . . .” Estava confirmada a maior tragédia naval em tempo de paz, o Titanic levara a vida de 1523 pessoas, entre tripulantes e passageiros.

A COMPETIÇÃO
                 O século XIX foi marcado por intensos movimentos populacionais. Famílias pobres do sisudo Velho Mundo viam grandes oportunidades na sorridente América; famílias americanas ricas ou emergentes viam os tradicionais produtos do Velho Mundo como a consagração de sua ascensão econômica. Assim, um grande trânsito transcontinental ocorria no Atlântico Norte da segunda metade do século XIX. A navegação comercial estava atenta a este grande filão, e a construção naval correspondia fielmente a seus anseios. Entre o apogeu dos navios a vela em 1850 e os grandes transatlânticos da primeira década do século XX, o trânsito de passageiros no Atlântico Norte passou de 200 mil para 1,4 milhão. A construção naval acompanhou estas necessidades construindo navios maiores, com o resistente aço e motores a vapor capazes de atingirem velocidades nunca antes imaginadas. Os grandes vapores da metade do século XIX tinham a média de 1,5 toneladas e cerca de 70 metros, os do início do século XX ultrapassavam 200 metros e deslocavam mais de 15 mil toneladas. Em 1851 o navio americano Pacific ganhou a “Fita Azul do Atlântico”, prêmio para maior velocidade, cruzando o oceano com uma velocidade média de 13,01 nós; em 1911 o transatlântico inglês Mauritanea recebeu a Fita Azul com a velocidade de 27, 04 nós. Os grandes concorrentes por esta fatia do mercado eram a Inglaterra, Bélgica, Alemanha e Estados Unidos, numa competição acirrada por qualidade, segurança e luxo a oferecer aos clientes.

A CONSTRUÇÃO
                 O nascimento do Titanic foi o fruto de mais um trust na construção naval, que envolveu grandes capitais americanos na Inglaterra. Por iniciativa do financista americano J. Pierpont Morgan, todas as ações da White Star (da Oceanic Steam Navigation Co.) passaram a pertencer a International Navigation Co., a qual fazia parte da sociedade americana Internacional Mercantile Marine Co., com sede em Nova Jersey. Com a injeção de capital, Bruce Ismay, filho do fundador da Oceanic Steam Navigation Co., resolveu devolver a primazia do Atlântico Norte à White Star, com a construção de três grandes transatlânticos: Olimpic, Titanic e Gigantic.

                A nova concepção adotada, deixaria de lado a ânsia pela “Fita Azul” e voltaria seus esforços para capacidade e luxo, bem como  (ironicamente) a oferta de maior regularidade e segurança nas viagens. O estaleiro escolhido foi o tradicional Harland & Wolff de Queen Island, próximo a Belfast na Irlanda.


                Os dois primeiros, Olimpic e Titanic, foram construídos juntos, sister-ships, com pouca diferença entre um e outro. Ambos foram construídos com 16 compartimentos, separados por 15 divisórias com portas estanques acionadas eletricamente pela cabine de comando. Possuíam também um fundo duplo, capaz de resistir a fortes colisões ou encalhamento. O engenheiro chefe Thomas Andrews optou por motores clássicos de 15 mil cavalos, com uma turbina de baixa pressão prevista unicamente para marcha à frente. O sistema dava uma potência total a ser transmitida às três hélices de 45 mil cavalos, capaz de produzir uma velocidade de 21 a 22 nós. O vapor era fornecido por 29 caldeiras com 159 fornalhas.



O TITANIC
                A colocação da quilha ocorreu em 1909, seu lançamento ao mar em 31 de maio de 1911 e o término da construção em março de 1912. Seus testes ocorreram em 1° de abril; estava chegando a hora de sua primeira viagem.
Era o maior navio de sua época, com 269 metros e 46.328 tonelas, ultrapassava seu irmão gêmeo, Olimpic, por alguns centímetros e algumas centenas de toneladas. Todos os equipamentos maiores (caldeiras, máquinas, turbinas, etc.) eram localizados em compartimentos independentes e o navio poderia continuar flutuando mesmo com dois compartimentos principais invadidos de água. Neste caso, cinco bombas de lastro, ligadas com três bombas de porão, podiam eliminar 400 toneladas de água por hora. Estas características somadas aos seu 16 compartimentos o levavam a ser considerado insubmergível. Um moderno sistema de telefonia (interfone) fora instalado, de tal forma que todos os pontos vitais poderiam se comunicar: ponte de comando, sala de máquinas, gávea, cada um dos compartimentos estanques, etc. Era um total de 50 ramais, de tal forma que determinadas suítes de 1° classe também poderiam usufruir do sistema, solicitando por telefone diversos serviços disponíveis. Conforme determinava a legislação em vigor, o grande navio contava com uma excelente central de telegrafia, com dois operadores que se revezavam vinte e quatro horas por dia. Uma academia de ginástica e uma piscina completavam o lazer dos mais abastados.
                Seus salões de jantar contavam com um serviço de 10.000 peças de louça e 21.000 talheres especialmente confeccionados pela sociedade Goldsmith & Silversmith para o Titanic.

O INÍCIO DA VIAGEM
                 Para comandante do novo transatlântico na sua primeira viagem, a White Star elegeu o Capitão Smith de 62 anos. Com uma aparência de patriarca do mar, era mesmo o comandante mais experiente que o Atlântico Norte conhecia. Esta viagem seria sua despedida do mar. E boa oportunidade para mostrar que a sua sorte não estava mudando, pois no ano anterior não pudera evitar que o navio-irmão do Titanic, o Olympic, colidisse com o cruzador ligeiro Hawke. A fenda a estibordo custou ao magnífico transatlântico uma longa temporada de estaleiro.
                 A viagem inaugural do Titanic, coberta do maior glamour, não poderia iniciar sem o embarque de grandes personalidades do mundo das finanças. Assim, no dia 10 embarcou o coronel John Astor, um dos homens mais ricos do mundo, cuja fortuna de 30 milhões de dólares provinha de uma rede de hotéis luxuosos, dentre eles o Waldorf Astoria de Nova York. Outro magnata que embarcara foi Benjamim Guggenheim, rei do cobre, possuidor de uma fortuna de 20 milhões de dólares. No mesmo nível, George Widener, "rei dos bondes", embarcou com a mulher e os filhos. Não se pode esquecer de Bruce Ismay, presidente da White Star, único sobrevivente desta linha de frente financeira.
Southampton, 10 de abril de 1912, 12:15h, a tripulação solta as amarras e inicia-se oficialmente a viagem para a América.

O IMPOSSÍVEL OCORREU
                Era o terceiro dia de viagem, a cada dia os motores eram forçados mais um pouco: no primeiro dia percorreu-se 464 milhas, no segundo 519, no terceiro 546. Para o dia seguinte estava previsto o acendimento das cinco últimas caldeiras e seria o melhor desempenho do Titanic, atingindo aproximadamente 23 ou 24 nós, ou 78 rotações da hélice. Durante todo o dia 14 de abril chegaram diversas mensagens informando sobre a presença de gelo, icebergs e banquisas próximo da Terra Nova e mais ao sul, na rota do Titanic.
                Às 22:00h assumia no comando o primeiro oficial Murdoch e, na gávea, os dois observadores, Fleet e Lee. A temperatura externa estava abaixo de zero grau. A troca do turno de observação ocorreria à 00:00h, porém às 23:40h os dois observadores se assustaram ao verem um iceberg bem à frente; tocaram o sino três vezes e informaram pelo telefone à cabine de comando. Murdoch recebeu a informação e antes mesmo de desligar comandou: “virar todo o timão a bombordo!”. Por cerca de 30 segundos o gigante manteve o curso de colisão frontal e então iniciou o leve deslocamento livrando a grande massa de gelo. Murdoch continuou a dar comando: “parem as máquinas!”, “marcha à ré em toda potência!”. O iceberg cresceu nos segundos seguintes e, então já livrando a grande massa, colidiu lateralmente. A grande montanha flutuante desfilou por toda a lateral do navio, derrubando vários blocos de gelo sobre os conveses. O choque não pareceu ser muito forte, apenas ouviu-se um rangido acompanhado de um pequeno balanço.
                O capitão Smith logo chegou a ponte de comando para se inteirar dos danos sofridos, neste momento o navio estava parando a frente, fazendo uma curva de 90° em volta de si mesmo. Havia um rasgo lateral e os dois primeiros compartimentos foram rapidamente inundados. No porão, funcionários dos correios se esforçavam para salvar as correspondências levando-as para triagem no convés G, porém em cinco minutos estavam com água pelo joelho e tiveram que abandonar este convés também. Os danos no casco atingiram os cinco primeiros compartimentos.
                Como as divisórias estanques não iam além do convés D, foi fácil prever o fim. Com a invasão de água progressiva nos cinco primeiros compartimentos, a dianteira do navio deveria afundar, permitindo que a água passasse por cima da divisória e invadisse os demais compartimentos. O afundamento era certo. Ironicamente uma colisão frontal com a montanha de gelo teria destruído completamente os três primeiros compartimentos, porém provavelmente deixaria o Titanic flutuando, com condições de chegar a América por seus próprios meios.
                Às 00:10h (15 de abril), após um breve cálculo, o engenheiro responsável pela construção do navio, Thomas Andrews, estimou em uma hora e meia a sobrevida da embarcação.
                Às 00:15h o Comandante Smith foi pessoalmente à sala do telégrafo e mandou enviar o sinal de perigo: “C.Q.D.”. O telegrafista enviou o designativo do Titanic “M.G.Y.”, o de perigo “C.Q.D.” e a posição 41.44N e 50.24O. A posição foi corrigida 10 minutos depois para 41.44N e 50.14O. Meia hora depois Smith determinou que se enviasse o novo sinal de socorro previsto pela conferência de Berlim de 1906. Às 00:45h ocorreu o primeiro S.O.S. da história. O novo código lamentavelmente deixava a única opção para a maioria das pessoas embarcadas (Save Our Souls - salvem nossas almas), pois perderiam a vida nas duas horas seguintes (*).
                Enquanto o processo de lançamento dos botes salva-vidas ocorria, muitas pessoas se recusavam a sair do navio que parecia estar firme. Muitos só se deram conta nos momentos finais quando a popa se ergueu bruscamente, chegando a 45°. Um total de 20 botes foram lançados ao mar. Às 2:20h do dia 15 de abril o Titanic desapareceu na escuridão do Atlântico Norte, sem qualquer turbilhão ou movimento de sucção.

O SALVAMENTO
                 Os operadores de telégrafo trabalharam ininterruptamente das 00:15h até 02:15h, quando foram autorizados a tentarem se salvar. Neste período transmitiram diversas vezes as mensagens de socorro que alcançaram oito navios num raio de 500 milhas. O mais perto era o California que estava a apenas 19 milhas, contudo encontrava-se imobilizado pelo gelo a sua volta. O mais distante era o Olympic, sister-ship do Titanic, que estava rumando para Irlanda e se encontrava a 500 milhas dali. A viabilidade de socorro recaiu sobre o navio da companhia Cunard, o Carpathia, que rumava para Gibraltar e se encontrava a 58 milhas. Imediatamente o comandante desta embarcação respondeu ao pedido de socorro e rumou para a coordenada indicada, assim como outros navios que se encontravam mais distantes.
                Exatamente ao amanhecer do dia o Carpathia chegou ao local do afundamento para vislumbrar apenas botes dispersos e muitos destroços.


                Um total de 711 sobreviventes foram recolhidos pelo Carpathia; destes, 394 mulheres ou crianças, 129 homens passageiros e mais 189 membros masculinos da tripulação.
 Carpathia


O REENCONTRO COM O TITANIC
Em 1985 uma expedição oceanográfica franco-americana coordenada pelo Dr. Robert Ballard descobriu os destroços do Titanic submersos a 3.800 metros (ou 12.600 pés) de profundidade, a 153 km ao sul dos Grandes Bancos de Newfoundland. (Coordenadas:41º 43'35" N, 49º 56'54" W). Uma nova expedição em 1986 levou uma equipe de filmagem da "National Geographic Society" para fazer as primeiras filmagens do transatlântico após 73 anos. Desde então, a empresa "RMS Titanic, Inc" obteve os direitos de realizar operações de salvamento no local e recuperou milhares de artefatos do navio.

Diversos equipamentos importantes ainda podem ser vistos pelas imagens obtidas; o telemotor, onde se encontrava aparafusada a roda do leme, as enormes âncoras com suas grossas correntes, as grades de proteção. Dentro da proa, na sala de rádio do Titanic, pode-se observar o painel elétrico, componentes do telégrafo. O Dr. Ballard retornou ao Titanic em 2004, para averiguar os danos que o navio sofreu desde o seu descobrimento. Concluiu que as inúmeras expedições e visitas ao local, só serviram para danificar o sítio arqueológico do Titanic e a aceleração da deterioração.

TITANIC NO CINEMA
Desde o desastre até os dias atuais o Titanic povoa o imaginário dos produtores da grande tela. Muitos filmes foram produzidos, mas o sucesso da história do Titanic não se apaga, eis aqui alguns deles:
 ATLANTIC (1929)
Atlantic foi o primeiro filme falado inspirado no Titanic. Produzido em 1929 por Ewald André Dupont, estrelaram Franklin Dyall e Madeleine Carroll. A história da tragédia de um navio fictício chamado Atlantic, supostamente indestrutível que se choca contra um iceberg e afunda no Oceano Atlântico. Foram produzidas duas versões, uma inglesa e outra alemã. Mais uma versão, agora francesa, foi lançada em 1930. Logo depois do lançamento do filme, houve a queda da Bolsa, levando a América à Grande Depressão. Nessa época de crise, o Titanic se tornou uma metáfora para o desastre econômico iminente.

TITANIC (1943)
Produção alemã realizada durante a Segunda Guerra Mundial a pedido de Josef Goebbels, Ministro da Propaganda Nazista. O filme foi confiado ao cineasta Herbert Selpin, contudo este entrou em choque com o roteirista e acabou por pronunciar frases injuriosas contra a Marinha do Reich, na presença de oficiais. Convocado a se retratar, negou-se e foi preso em 31 de julho de 1942; sendo “suicidado” logo após, digo, suicidou-se em seguida, segundo a versão oficial. Werner Klingler foi encarregado por Goebbels para terminar o filme. O filme foi utilizado como campanha anti-britânica, apontando as mazelas da ambição e do lucro insaciável que levou a morte de tantas pessoas, bem como as mentiras cínicas utilizadas para encobrir responsabilidades.

A NIGHT TO REMEMBER (1958)
A Night to remember (Somente Deus por testemunha) é uma adaptação para o cinema do drama-documentário do livro de Walter Lord (1955), contando a última noite do RMS Titanic. Foi adaptado por Eric Ambler, dirigido por Roy Ward Baker, e filmado no Reino Unido. O quarto oficial do Titanic, Joseph Boxhall, e o Comodoro da empresa Cunard, Harry Grattidge, ambos trabalharam como consultores técnicos do filme.

S.O.S. TITANIC (1979)
É um filme para TV de 1979 que retratou a viagem de 1912 contada a partir da perspectiva de três grupos distintos de passageiros: da Primeira, Segunda e Terceira classes; tudo historicamente preciso. O roteiro foi escrito por James Costigan e o filme dirigido por William Hale.

TITANIC (1997)
Uma realização magnífica de  James Cameron, ganhadora de onze Oscars. O drama conta a história de amor de um imigrante jovem e pobre, Jack Dawson, e a bela e rica Rose DeWitt Bukater; estrelado por Leonardo Di Caprio e Kate Winslet. Toda a produção e cenários são magníficos e grandiosos.
Embora os protagonistas do romance sejam fictícios, Jack e Rose, e também o noivo vilão dela, Caledon Hockley (Billy Zane), e seu malvado guarda-costas, Spicer Lovejoy (David Warner, muitos outros personagens são verídicos, como: a sobrevivente milionária Molly Brown (Kathy Bates), o arquiteto do navio, Thomas Andrews (Victor Garber), que desapareceu com ele, e o proprietário da embarcação, Bruce Ismay (Jonathan Hyde) que foi visto escapando num dos insuficientes botes salva-vidas, onde deveriam ter embarcado apenas mulheres e crianças.
Para o centenário em 2012 o filme foi reciclado ganhando uma versão em 3D.
  
TITANIC THE EXPERIENCE
                Se você pretende se sentir um pouco mais perto do luxo e beleza do Titanic, não precisa ir a quase 4.000 metros de profundidade; na sua próxima viagem a Orlando (EUA), você poderá conhecer um museu do Titanic (8445 International Drive, Orlando, FL 32819).
A exposição "Titanic, the experience" conta com muitas réplicas de artefatos, trajes da época, além de uma réplica em tamanho real da famosa escadaria da primeira classe e de uma das suítes.
                O ingresso para o museu é também uma lembrança e homenagem aos que pereceram no Titanic, pois cada ingresso corresponde a um passageiro ou tripulante e traz sua breve história de vida e morte no mar.





  (*) S.O.S. - Composições como Save Our Souls (salve nossas almas) ou Save Our Ships (salve nossos navios) são crenças populares, pois a convenção de 1906 escolheu estas letras apenas pela simplicidade de transmissão (3 pontos, 3 traços e 3 pontos).

Um comentário:

  1. Simplesmente adimiro o trabalho do site várias histórias super interessantes para quem gosta de ler é um prato cheio ...

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