domingo, 2 de setembro de 2012

CASO ROSENBERG (THE ROSENBERG AFFAIR)



Julius e Ethel Rosenberg, casal de judeus norte-americanos, foram acusados no início da década de 50 de venderem aos soviéticos os segredos de fabricação da bomba atômica e muitas outras informações consideradas saltos tecnológicos-militares. Depois de um controverso julgamento, de vinte e seis apelações de clemência e diante de uma conturbada e confusa opinião pública mundial, eles se tornaram os únicos cidadãos civis dos EUA a serem executados por conspiração. Os Rosenbergs encontraram seus destinos na cadeira elétrica do presídio de Sing Sing sem nunca admitirem suas culpas, deixando grandes dúvidas quanto a idoneidade do julgamento e colocando em xeque todo o aparato judiciário americano.


PANO DE FUNDO
                Terminada a Segunda Grande Guerra, os EUA emergiram como única potência bélica e econômica mundial e, ainda, com seu território intacto.  Por outro lado a URSS recuperava-se heroica e vertiginosamente, principalmente no campo bélico. Era a esperança de equilíbrio de forças da outra metade do Mundo, era a Guerra Fria em pleno vapor. Em fins da década de 40, o mundo viu a sovietização do Leste Europeu, o Bloqueio de Berlim e as intimidações soviéticas à Grécia e à Turquia. A esta última, os americanos respondiam com a Doutrina Truman, apoio econômico e militar a estes dois países. Em 1949 os comunistas liderados por Mao Tsé-Tung tomaram poder na China e os soviéticos detonaram sua primeira bomba nuclear, graças aos saltos tecnológicos extraordinários proporcionados pela sua rede de espiões no ocidente. Em 1950 começou a Guerra da Coréia, a qual em três anos mataria cerca de 35 mil norte-americanos.
                Internamente, os Estados Unidos era contagiado pelo vírus da histeria anti-comunista, disseminado a partir de fevereiro de 1950 por um obscuro senador de Wisconsin, Joseph R. McCathy.

O PRINCÍPIO
                Em fevereiro de 1950, as autoridades britânicas prenderem Klaus Fuchs, alemão naturalizado americano, e um dos cientistas estrangeiros que acompanharam a preparação e explosão da primeira bomba atômica norte-americana. Fuchs era acusado de repassar segredos militares americanos aos soviéticos. Acionado o Federal Bureau of Investigation (FBI), descobriu-se que seu contato americano era Harry Gold na cidade da Filadélfia. Preso, Gold logo confessou que o responsável por lhe passar informações secretas, era David Greenglass, ex-sargento do Exército dos Estados Unidos, que trabalhara no centro de provas atômicas de Los Alamos.
                Greenglass, ao ser preso pelo FBI, em 15 de junho do mesmo ano, concordou em entregar todo o grupo às autoridades. O grupo a que ele se referia era o cunhado Julius Rosenberg e a irmã Ethel. Consta do processo que Greenglass copiou projeções e fez anotações sobre o programa de pesquisa atômica dos Estados Unidos, as quais foram entregues aos soviéticos. Harry Gold, o correio de Fuchs, cofessou ao FBI que recebeu instruções do vice-consul da União Soviética em Nova York, Anatoli Yakoviev, para procurar David Greenglass com a senha “Venho em nome de Julius”. Segundo David Greenglass, ele e sua esposa haviam sido recrutados por Julius Rosenberg que seria o principal gerente desta rede de espionagem para os soviéticos.
                A situação dos Rosenbergs agravou-se quando David afirmou ter entregue os desenhos e anotações ao seu cunhado Julius e  que sua irmã, Ethel, havia datilografado as anotações.
                Em 16 de julho de 1950, três homens bateram à porta dos Rosenbergs e levaram Julius preso. Vinte e quatro dias depois chegou a vez de Ethel ser presa. Ambos resistiram e negaram totalmente as suas participações no esquema de espionagem.

                O julgamento começou no dia seis de março de 1951, com um júri formado por onze homens e uma mulher. Muitas petições feitas pelo advogado Emmanuel Bloch reclamando de erros processuais foram firmemente rejeitadas pelo juiz Irwing Kauffman. A 5 de abril de 1951, o casal, que recusou qualquer acordo para confessar o crime, ouviu, de mãos dadas, a sentença que os condenou à morte: “O crime que cometeram é pior que o de assassinato. Acredito que a conduta de ambos, colocando os segredos da bomba atômica no poder da União Soviética, alterou o curso da história, com desvantagem para nosso país... ela causou... a agressão comunista na Coréia, que resultou na morte de pelo menos 50 mil pessoas e, quem sabe, milhões de inocentes pagarão o preço de suas traições”.
Juiz Irwing Kauffman


 COMOÇÃO NACIONAL E REPERCUSSÃO INTERNACIONAL
                O movimento de esquerda americano, que se calara nos primeiros momentos do caso, logo partiu para a franca defesa dos Rosenbergs, denunciando como caso de anti-semitismo, armação judicial e histeria anticomunista. Foi criada a Comissão Nacional por Justiça no Caso Rosenberg, a qual publicava na forma de opúsculo as cartas do casal, causando grande comoção (o casal escreveu um total de 568 cartas na prisão Sing Sing).
                Albert Einstein escreveu uma carta ao The New York Times pedindo clemência para os Rosenbergs. Próximo à execução, a Casa Banca recebia milhares de cartas e telegramas pedindo clemência ao casal. Mal o presidente Dwight David Eisenhower assumiu o cargo em janeiro de 1953, se deparou com o "presentinho" do seu antecessor, Harry Truman: o pedido de clemência dos Rosenbergs. Em 16 de fevereiro, Eisenhower, enfrentando todo o descontentamento popular, negou oficialmente o pedido de clemência.
                Para os franceses, a possibilidade de que o casal Rosenberg fosse executado injustamente fez com que aquele povo desenterrasse seus próprios fantasmas. Tocando fundo a psiquê nacional, relembraram o Caso Dreyfus, comparando seu próprio anti-semitismo, erros processuais gritantes, intrigas e falsidades ocorridos naquele caso com o que supunham estar ocorrendo com o Caso Rosenberg. Em novembro de 1952, l’affaire Rosenberg ganhou status de escândalo com a publicação de um artigo de Howard Fast (membro do PC americano e romancista renomado) no jornal comunista l’Humanité. Fast denunciou o fascismo em torno de Eisenhower e a histeria anticomunista. No jornal de esquerda Libéracion, Jean-Paul Sartre qualificou a iminente execução dos Rosenbergs de “linchamento legal, que mancha de sangue toda a nação”. A 3 de dezembro de 1952 foi fundado em Paris a Comissão Internacional de Defesa dos Rosenbergs.
                Na Itália, a imprensa mergulhou de cabeça na defesa dos Rosenbergs, praticamente obrigando o Papa Pio XII a usar sua influência para barrar a execução. Até na Inglaterra, cujo serviço secreto fora o estopim da trama, as mobilizações ocorreram, embora tardiamente.

O PRINCÍPIO DO FIM -  O JULGAMENTO
                Três pontos marcaram de forma indelével o julgamento dos Rosenbergs:
1° - Irmão contra irmão: Com forte apelo emocional, o testemunho de David Greenglass incriminando a irmã, Ethel Rosenberg, como responsável por datilografar todos os documentos que seriam enviados para a União Soviética, e o cunhado, Julius, responsável por gerenciar uma rede de espionagem, causou uma profunda impressão no júri. Se por um lado David era visto como um monstro capaz de quebrar os laços familiares para salvar a sua própria pele, por outro dava uma credibilidade inquestionável ao seu depoimento, demonstrando um forte arrependimento por ter traído sua pátria.
2° - Impugnação das provas técnicas: O principal advogado de defesa dos Rosenbergs, Emmanuel Bloch, tentou uma manobra (inexplicável) cujo "tiro saiu pela culatra". Bloch solicitou que as provas técnicas, compostas dos desenhos da lente detonadora da bomba atômica (feitos de memória por David Greenglass) e 12 páginas descritivas do seu funcionamento, fossem impugnadas, para não fornecer elementos secretos aos inimigos da nação norte-americana, mesmo tendo as referidas sido autorizadas, em caráter excepcional para este julgamento, pela Comissão Nacional de Energia Atômica. Este ato somado ao depoimento do cientista Walter Koski, o qual afirmou que os desenhos eram aproximados o suficiente, portanto úteis aos cientistas atômicos soviéticos, afetaria fortemente o ânimo dos jurados no sentido de dar importância e relevância a tais provas. O pedido de impugnação das provas por parte da defesa deixou o próprio promotor-chefe, Saypol, confuso, pois ele acusaria com a certeza de não dar aos réus qualquer possibilidade de defesa, ou seja, provar que as informações eram praticamente irrelevantes para o esforço soviético. Este episódio deixaria claro para o júri que a defesa assumia, assim, que seus clientes passaram informações secretas, relevantes e de extrema importância estratégica para os soviéticos.
3° - Recurso a 5° Emenda: Recorrer excessivamente a 5° Emenda Constitucional, ou seja, negar-se a responder para evitar constituir prova contra si, foi uma tática utilizada incontáveis vezes tanto por Julius quanto por Ethel Rosenberg, quando questionados sobre assuntos que se referissem as suas participações no partido comunista. Esta prática não pode realmente ser levada em consideração para incriminar o réu, contudo o efeito sobre os jurados naquele momento foi diametralmente oposto, pois a cada recusa e invocação a quinta Emenda um grande golpe era dado na confiança e credibilidade tanto pessoal (dos réus) quanto do próprio Partido Comunista Americano. Assim, descartar o Partido Comunista do enredo invocando a 5° Emenda, fazia parecer cada vez mais que era uma tentativa de apagar a real vontade dos réus de passar informações secretas aos comunistas, o que nem era objeto do julgamento, pois eram acusados de conspirar para espionar para uma nação estrangeira, independente do regime desta.
Um dos rascunhos de David Greenglass


O FIM DO PRINCÍPIO - A EXECUÇÃO
                A sentença proferida em março de 1951 agora tinha data para ser executada, 19 de junho de 1953. Dias antes, milhares de manifestantes se organizavam para tentar comover o Presidente Eisenhower. Na quinta-feira, 18 de junho, cerca de 900 manifestantes partiram de Nova York, num trem especialmente alugado, com destino à Casa Branca, engrossando, assim a vigília promovida pela Comissão Nacional por Justiça no Caso Rosenberg.



                Todos estavam com os nervos à flor da pele quando dois dias antes da data marcada um grupo de jornalistas recebeu a informação de que o juiz William Douglas decidiria sobre uma importante liminar no caso Rosenberg. O advogado Fyke Farmer levantou a seguinte questão a ser apreciada em liminar: a Lei de Energia Atômica aprovada em 1946 poderia mesmo ser aplicada em crimes cometidos em 1944 e 1945? Farmer sustentava que sim, pois a conspiração descrita na denúncia prosseguira nos anos de pós-guerra. Desta forma os Rosenberg teriam sido julgados por uma lei errada, a Lei de Espionagem de 1917, a qual deveria ter sido substituída pela Lei Atômica de 1946. Isso dava a vantagem de que esta segunda lei só permitia a pena de morte se a promotoria pudesse provar que os réus tinham deliberadamente pretendido prejudicar a defesa nacional.
                Naquele dramático momento quando os advogados Fyke Farmer e Daniel Marshall se deixavam fotografar juntos, o oficial da Suprema Corte, Harold Willey, anunciou a sentença de Douglas: Liminar concedida!
                Em questão de minutos a informação chegou às multidões em frente ao prédio da Suprema Corte e da Casa Branca. No presídio de Sing Sing, o diretor, Wilfred Denno, divulgou pelo sistema de auto-falante.
                A alegria não duraria muito, o juiz Frederick Vinson, presidente da Suprema Corte, ao tomar conhecimento da liminar, convocou o tribunal em sessão especial para o dia seguinte, a fim de analisar e votar a liminar.
                Às 12h do dia 19 a Suprema Corte anunciou a negação do pedido de adiamento da execução. A execução estava mantida para as 23 horas daquele dia. Cerca de 5 mil pessoas se aglomeraram na Union Square em Nova York para protestar contra a execução. Como última tentativa Bloch redigiu um último apelo de clemência ao presidente; partiu às pressas para a Casa Branca, tentou entregar o pedido ao ajudante-de-ordens do presidente, Sherman Adans, ou ao secretário de Imprensa, James Hagerty; sem obter êxito, deixou o pedido, junto com uma carta de Ethel, na portaria. Eisenhower foi implacável ao negar o pedido. Numa ação desesperada os advogados de defesa apresentaram ao juiz Kaufman a alegação de que não seria certo que os condenados morressem durante o Sabá, quando os judeus ortodoxos evitam qualquer atividade desnecessária. Não podendo mais protelar a execução decidiu-se antecipar para pouco antes do por do sol do dia 19, exatamente às 20:00h, portanto antes do início do Sabá.
                Em Sing Sing Julius e Ethel recebem a permissão de passarem alguns momentos juntos antes da execução. Ethel escreveu a última carta para seus filhos, a qual trazia como última frase antes da despedida o seguinte: “Lembrem-se sempre de que somos inocentes e não poderíamos violentar nossa consciência.” Não é difícil imaginar o efeito destas palavras nas cabecinhas de Robert, 6 anos, e Michael, 10 anos. E a força com que isto alimentaria suas lutas por justiça e para limpar o nome da família no futuro. Nas últimas horas no seu pequeno cubículo (4x2m) Julius guardou todos os seus pertences e fez seu testamento, dando a guarda de seus filhos a Emmanuel Bloch, principal advogado de sua defesa; deixou aí também um apelo dramático: “Jamais permita que mudem a verdade de nossa inocência”.
Chegada a hora, Julius foi levado a câmara de execução. Às 20:01h a multidão amontoada em vigília na Union Square recebe a notícia da execução de Julius. Não havia mais esperança! Chegou a hora do rabino Irving Koslowe acompanhar Ethel a sala de execução. Ele clamou para que ela dissesse alguma coisa que suspendesse a execução; um nome, um fato, qualquer coisa. Mas Ela, impassível, respondeu apenas que nada sabia, que era inocente. Seguiu impassível para câmara de execução e cadeira elétrica. Às 20h11min30s Joseph Francel, o executor, acionou a primeira descarga elétrica. Três descargas de 2000 volts; mas quando da inspeção médica ela ainda estava viva. Mais duas descargas e às 20h16min ela estaria morta. O pôr do Sol anunciava o Sabá.
                A execução seguiu o protocolo padrão adotado pelo estado de Nova York desde 1889, eletrodos embebidos em água salgada são colocados na cabeça do condenado, então é aplicada um descarga elétrica de 2000 volts por três segundos, seguidas de mais duas descargas de um minuto. Um capuz colocado na cabeça poupa os espectadores da visão das convulsões durante as descargas elétricas.
                Dois dias depois, mais de oito mil pessoas acompanhariam o funeral do casal. Manny Bloch, advogado que acompanhou o caso desde o início e tentou os pedidos de clemência junto ao presidente fez um discurso feroz acusando Eisenhower, o Secretário de Justiça e o chefe do FBI,  J. Edgar Hoover.

O PACTO DE SILÊNCIO E SUAS CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS
                O que teria levado Julius e Ethel a negarem-se a possibilidade de terem suas penas comutadas para prisão e poderem criar seus filhos? Aos olhos de muitos, principalmente de seus filhos, apenas uma forte convicção na inocência os faria negar um acordo de confissão, deixando-se fritar na cadeira elétrica e abandonando suas crianças órfãs de pai e mãe. Um sentimento de crueldade assolou os EUA, e no mundo todo pairou uma nuvem negra de injustiça e falta de clemência. Décadas passariam com a questão Rosenberg desenterrada de tempos em tempos e martelando nossas consciências. Teriam os EUA cometido a maior injustiça de sua história? Quem tinha a resposta?
                No final da década de 70 e início da de 80, os filhos do casal, Michael e Robert, militaram ferozmente pelo direito de reverem todas as peças do processo que executou seus pais, numa tentativa hercúlea de limpar o nome da família e desfazer uma suposta injustiça que durava décadas.


THE ROSENBERG FILES
                Desde a década de cinquenta muitos livros foram escritos sobre o julgamento e execução do casal Rosenberg, mas o divisor de águas para esta estória surgiu com um artigo de Ronald Radosh com coautoria de Sol Stern, publicado em 1979 no The New Republic. Radosh, comunista apaixonado e muito atuante nos Estados Unidos, resolveu colocar a sua formação a serviço de sua ideologia (graduado e doutorado em história) e conceber um projeto de pesquisa a fim de realmente provar a inocência e limpar o nome dos Rosenbergs. À medida que se aprofundava em suas pesquisas concluía pela culpabilidade do casal. Além de contar com 2000 páginas do processo dos Rosenbergs, fez centenas de horas de gravações de entrevistas com expoentes de esquerda contemporâneos, que à época tinham orientação para ocultar as ligações de Julius, porém passados os anos resolveram liberar as informações verdadeiras. Atormentado, procurou conselho de seus amigos de esquerda para publicar um artigo sobre o assunto. Tal atitude foi gravemente repudiada por todos os seus amigos militantes. Radosh declara que mesmo antigos amigos deixaram de falar com ele por causa do artigo e sofrera ataques tanto do Governo quanto da esquerda americana que apoiava a inocência dos Rosenbergs. No centro deste último grupo estava o filho mais novo do casal, Michael Meeropol que o acusava de estar tentando desarticular completamente a esquerda Americana e resuscitar a “constelação de ideias” que levaram seus pais para a cadeira elétrica.
Sem desanimar, o historiador reviu todo o seu projeto, tendo acesso a cerca de 200.000 páginas de documentos tornados públicos a partir de julho de 1975 por diversas agências, como FBI, CIA e Department of the Navy, em decorrência do Freedom of Information Act (Lei de Liberdade de Informações). Em decorrência dessa extensa pesquisa surgiu, em 1983, o livro The Rosenberg file, a search for the truth; escrito por Ronald Radosh em parceria com Joyce Milton. Assim, concluía sem sombra de dúvidas que Julius havia sido um espião da União Soviética e que Ethel não só tinha conhecimento como participava das ações. Por este brilhante trabalho de pesquisa Radosh foi brutalmente atacado pela esquerda, pela imprensa, pelas universidades e pelas editoras. Viu-se desempregado e com dificuldades para se manter. O mundo não estava pronto para admitir que os Rosenbergs poderiam ser realmente espiões e que o governo americano não havia cometido a maior injustiça judiciária de sua história.

                A pesquisa de Radosh chegou a seis conclusões:
1) Julius Rosenberg teve um papel importante na rede de espionagem soviética e passou informações àquele país, que acreditava ser de grande relevância sobre a bomba atômica;
2) Klaus Fuchs já havia passado anteriormente segredos atômicos aos soviéticos e os desenhos fornecidos por David Greenglass confirmavam as informações anteriores;
3) Embora Ethel Rosenberg não tenha se envolvido profundamente no serviço de espionagem, tinha conhecimento destas atividades e datilografou diversas páginas de informações;
4) O FBI sabia do papel limitado de Ethel Rosenberg, mas forçou a promotoria a exagerar seus atos a fim de pressionar Julius a colaborar;
5) Muitas das evidências contra os Rosenbergs eram altamente questionáveis e provavelmente falsas (neste caso verificou-se anos mais tarde que a estória não era bem assim, pois existiam evidências sólidas, contudo ainda não podiam ser dadas a conhecimento público por uma questão de segurança nacional);
6) Quase todos os envolvidos no enredo (da KGB ao FBI, passando-se pelos defensores) ariscaram francamente a vida dos dois a fim de defenderem seus interesses particulares.
                Suas conclusões só viriam a ser completamente confirmadas para o público geral com a divulgação pelo Governo Americano das chamadas Mensagens Venona em julho de 1995.

AS MENSAGENS VENONA
A agência americana de informação, National Security Agency (NSA), dedicou dezenas de anos ao árduo trabalho de tentar decodificar as mensagens enviadas para KGB em Moscou. Com seu mais importante projeto, denominado Venona, possibilitou a tradução de várias mensagens criptografadas graças a um livro de códigos soviético encontrado pelos finlandeses em 1941 e remetido aos americanos em 1945. Os especialistas da NSA foram capazes de decifrar mensagens secretas endereçadas à sede da KGB entre 1943 e 1945. Venona permitiu identificar as atividades do casal Rosenberg, mas o governo americano não poderia deixar que o governo soviético soubesse da operação que estava em curso. Por isso nenhuma mensagem decodificada sobre os Rosenbergs foi fornecida ao tribunal que os condenou, dificultando o trabalho do juiz e dos jurados, confrontados com provas apenas circunstanciais.  Graças à manutenção deste segredo foi possível identificar outros espiões que revelaram os segredos da bomba americana à URSS (Klaus Fuchs, Nunn May, Bruno Pontecorvo) e neutralizar alguns espiões soviéticos de primeira importância, entre eles Burgess e Maclean, do grupo de Cambridge. O casal morreu na cadeira elétrica jurando inocência e comovendo o mundo, no entanto, os documentos divulgados pela NSA em 12 de julho de 1995 (confirmados em fevereiro de 1996 por um general russo da reserva) mostraram que Julius Rosenberg era o chefe de uma importante rede de espionagem que trabalhava para a URSS sob o pseudônimo Antenna - Liberal. Além disso, uma mensagem de 27 de novembro de 1944 provou que Ethel estava a par das atividades de seu marido. Outras mensagens sugerem que os Rosenbergs trabalhavam no recrutamento de novos espiões. Consulte as mensagens Venona nos endereços oficiais abaixo:




ALEXANDER FEKLISOV
                Muitas vezes o caso Rosenberg parece estar totalmente esclarecido e resurgem novas questões, sempre pretendendo limpar o nome Rosenberg e acabar com o rótulo de espiões ou traidores. Mesmo com a liberação, por parte do Governo Americano, das mensagens Venona, os irmãos Michael e Robert Meeropol-Rosenberg teimaram em discordar, duvidando da veracidade de tais mensagens interceptadas. Acusaram o FBI e CIA de criarem estas provas para justificar o julgamento e execução de seus pais em 1953. Segundo estes, as mensagens Venona não dizem nada, embora digam tudo! Sendo assim, por mais que se saiba sobre o caso sempre paira uma nova dúvida. Atualmente Robert defende a total inocência de sua mãe, já que as provas contra Julius são totalmente irrefutáveis há mais de duas décadas.
                Recentemente mais uma parte da estória de espionagem soviética veio à tona. Alexander Feklisov, importante membro da KGB e responsável por uma significativa rede de espiões nos Estados Unidos e Reino Unido, resolveu falar publicamente sobre suas atividades naquele período. Suas primeiras revelações foram ao ar num programa da Discovery Channel em 1997. Talvez esta experiência o tenha incentivado a publicar suas memórias, onde finalmente pôs a descoberto alguns círculos de espionagem da antiga União Soviética nos Estados Unidos. Feklisov trabalhou no Consulado Soviético em Nova York entre 1941 e 1946. Lá recebeu a missão de seu superior, Anatoly Yatskov, de promover o recrutamento de espiões militares e industriais contra os EUA. Feklisov defende Julius Rosenberg por seu trabalho em prol do estado soviético, alegando que as informações com valor militar ajudaram à defesa da União Soviética (e do Comunismo) contra a ameaça nazista e, em posterior análise, detalhes da bomba atômica garantiram aos cientistas soviéticos o rápido desenvolvimento desta (aliás baseadas detalhadamente nos protótipos americanos). Segundo declara Feklisov em sua biografia, ele mantinha encontros com Julius, a quem chamava de Libi (seu codinome era oficialmente Liberal), de frequência semanal, chegando a ter um total de aproximadamente 50 encontros, nos quais Julius o entregava de 600 a 1000 páginas de material sensível. Além dos Rosenbergs, também Joel Barr, Albert Sarant e William Perl faziam parte da rede de espionagem sob sua responsabilidade, todos foram aliciados por Julius por terem amizades do tempo de escola e serem simpatizantes do comunismo soviético. 
             Embora a rede de Julius tenha produzido algum material sobre a bomba atômica (vindo das mãos de David Greenglass) este era de pouco valor, por outro lado, as informações relativas ao desenvolvimento de outros equipamentos como radar, infravermelho, sonar, além de dados completos do caça à jato P-80 Shooting Star eram de valor inestimável e economizaram muitos milhões de dólares para a URSS. Exemplo chocante disso está no presente de Natal de 1944 que Julius entregou a Feklissov, o Fusível de Aproximação, elemento essencial para contrabalançar a guerra aérea, pois com ele o projétil da artilharia explodiria próximo do alvo (e não ao contato), garantindo a eficácia de seus fragmentos e que o mesmo não se perdesse caso não atingisse o alvo em cheio. Julius não entregou anotações ou manuais somente, entregou o próprio dispositivo funcionando para que os soviéticos estudassem e adaptassem para sua anti-aérea. Este presentinho roubado havia custado cerca de um bilhão de dólares em desenvolvimento ao governo americano.

Fuso de aproximação

                Julius também fora o responsável por recrutar Morton Sobell, engenheiro pesquisador da General Eletric, responsável por subtrair quarenta pesquisas completas, representada por milhares de páginas de textos e desenhos sobre sonares, raios infravermelho, dispositivos de artilharia e as primeiras informações sobre mísseis teleguiados. Sobell também fora descoberto e julgado junto com os Rosenbergs, sendo condenado a trinta anos de prisão.

O IRMÃO


                No caso Rosenberg, David Greenglass se tornou o estopim de uma tragédia familiar de proporções épicas. Desde o início David e sua esposa Ruth foram taxados pela promotoria, juiz e opinião pública como os grandes traidores, pois foram capazes de trair os próprios parentes próximos, segundo se afirmou, para salvar a própria pele. Após sua performance pública de três dias, David emergiu como grande vilão e morreu para o mundo; desapareceu das vistas públicas, cumpriu sua prisão e passou a viver sob pseudônimo o resto da vida.
                O grande responsável pela condenação se calou por muitos anos, contudo depois de quase 46 anos após a execução do casal, David resolveu falar ao jornalista Sam Robert, que há muitos anos estudava o caso. Desta entrevista reveladora surgiu, em 2001, o livro The Brother, the untold story of the Rosenberg case, o qual esclarece as últimas dúvidas sobre caso.
                O irmão de Ethel jamais quis a morte de sua irmã, pelo contrário, acreditava que cooperando com a justiça e o FBI, estaria salvando a vida de todos, da mesma forma que salvou a sua. Por outro lado, suas convicções de esquerda eram extremamente fracas e, fora da forte influência de Julius, encontrava-se arrependido do que fizera. Vendo o desmantelamento da rede de espionagem como a única forma de reparar o seu erro. Toda a sua família estava e permaneceu ao seu lado nesta decisão, consequentemente contrários a decisão de Ethel de continuar negando os fatos e levar tudo até a última consequência.
                De fato, esquecendo-se de que David foi um agente de espionagem, ele quase poderia ser considerado um herói que teve de passar por uma dura provação para reparar os danos decorrentes do vazamento dos segredos americanos para Moscou.
                De sua parte, David fez o possível para evitar a morte de sua irmã, mas ela estava decida a morrer pelos ideais (não muito claros) de Julius.
David Greenglass


CONCLUSÃO
                Por algum tempo duvidou-se que Julius Rosenberg fosse realmente espião soviético, atribuindo-se ao caso uma histeria macartista amparada por fraudes e erros processuais. A despeito das reais fraudes e erros que possam ter ocorrido no processo, Julius Rosenberg foi realmente um espião muito produtivo para a União Soviética e infringiu graves prejuízos na hegemonia americana do pós-guerra. Quanto a Ethel Rosenberg, não há como negar que ela era conhecedora, no mínimo, de todas as atividades do marido, portanto sendo justo seu julgamento como conspiradora. No entanto, também não se pode negar que sua pena fora injustamente pesada e fruto de uma pressão para que Julius confessasse, já que sua contribuição fora bastante limitada.
                O caso todo pode ser definido como duas estratégias opostas que deram errado. Como numa queda de braço; de um lado os Rosenbergs negavam sua culpa na esperança de sensibilizar a opinião pública, única capaz de brecar a execução àquele momento. Conseguiram mobilizar multidões, mas não brecaram a execução. Do outro lado, a justiça americana (pressionada pelos sistemas de informações) forçava a condenação quase injusta de Ethel a morte para fazer com que Julius confessasse. Na cela de execução foi colocado um interfone para que pudessem confessar até o último momento, necessitando apenas retirar o aparelho do gancho e falar. Para que toda a história tivesse outro desfecho bastava que os dois lados cedessem um pouco e todos sairiam vencendo; o casal não morreria e logo a culpa deles viria inegavelmente à tona. Contudo a queda de braço prosseguiu de forma irracional e ambos os lados perderam. Os Rosenbergs mantiveram suas alegações de inocência e foram executados. A execução por sua vez foi um terrível golpe na credibilidade do sistema judicial americano e, em última análise, no próprio governo; levando a cabo uma condenação excepcionalmente pesada e amparada em provas apenas circunstanciais.

VEJA IMAGENS HISTÓRICAS

REFERÊNCIAS

FEKLISOV, Alexander. The man behind the Rosenbergs. Engma Books. New York, 2004.

KOURI, Assef. O caso Rosenberg, 50 anos depois. Códex., Lu Fernandes escritório de comunicação. São Paulo, 2003.

NATIONAL SECURITY AGENCY. Venona. Disponível em:<http://www.nsa.gov/applications/search/index.cfm?q=venona>. Acessado em: 21 julho 2012.

RADOSH, Ronald e MILTON, Joyce. The Rosenberg files, a search for the truth. Holt, Rinehart and Winston, New York, 1983.

ROBERTS, Sam. The Brother, the untold story of the Rosenberg case. Random House Trade Paperbacks Editions. New York, 2003.

2 comentários:

  1. Matéria Muito Interessante, gostei muito.
    Grande Abraço Manteiguinha

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  2. De todos os textos que li a respeito, esse foi o melhor. Parabéns pelo seu trabalho.

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